Educar é preciso

Quão bom seria se a facilidade de criar um filho fosse tão grande quanto a facilidade de se fazer um filho. Acho que essa afirmação explica muito o porquê de hoje termos tantas crianças rebeldes e indisciplinas e tantos pais mal preparados pra essa empreitada que é a educação infantil. O ser humano tem uma característica bem interessante; de tempos em tempos temos o que se chama de “tendências sociais de comportamentos”. A cultura é cheia de exemplos. Em uma época, certa roupa e atitude estão na moda e são mais aceitas e em outros períodos a situação se inverte. Parece haver uma necessidade periodicamente de se superar um padrão de conduta e comportamento e substituí-lo por outro. Até certo tempo atrás, o padrão de educação infantil era o modelo mais rígido, muitas vezes punitivo e “impositório”. Esse modelo mais “severo” foi deixado pra trás e atualmente temos, em muitos casos, o seu extremo oposto. Onde antes existia excesso de severidade, hoje existe excesso de permissividade.

Na vida, em geral, tudo que vem em excesso é prejudicial, e na educação infantil não é uma exceção. Uma educação equilibrada não só é benéfica como necessária para uma boa construção de caráter e ética pessoal. Punir demais, reprimir demais, proibir demais, dizer muito não, prender demais vai ser tão ruim quanto não punir quando necessário, não colocar limites, fazer sempre os gostos do filho e dar excesso de liberdade. Os pais precisam entender que a autoridade é necessária, mas o autoritarismo não. Que regras são necessárias, mas têm que fazer sentido e serem coerentes com o que os pais demonstram. Os filhos não nascem programados pra terem bons comportamentos, eles terão modelos para se espelharem e os pais serão os primeiros modelos.

Indisciplina e rebeldia infantil

Como foi dito anteriormente a criança não nasce programada com os melhores comportamentos. Nem, tão pouco, nasce sabendo o que é certo e errado. A noção do que é certo e errado vai ser desenvolvida, principalmente, pelos: modelos de seu convívio (geralmente os pais), pelo processo de orientação (conversas que se tem com a criança) e como se trabalha conseqüências dos comportamentos da criança.

-Modelo de convívio

Crianças vão tentar imitar e reproduzir comportamentos de pessoas com quem convive. Essas pessoas podem ser pais e parentes, assim como amigos. Por isso, é necessário que os pais sejam coerentes com o que exigem dos filhos. Pais que não costumam ler na frente da criança vão ter mais dificuldade de exigir ou passar a idéia de que a leitura é agradável. Pais que falam gritando vão ter dificuldades de exigir que a criança também não grite. Pais que não são responsáveis terão dificuldades em exigir responsabilidade dos filhos.

-Conversar com a criança e responsabilizar pelos atos

A conversa é muito importante. Não apenas quando a criança faz algo de errado. Mas também para se explicar “como as coisas devem ser”. Porém a conversa por si só não é o bastante. Mesmo conversando a criança vai ocasionalmente fazer “algo que não deveria”, na verdade isso é até esperado. Testar os limites é algo implícito ao ser humano e com a criança não é diferente. Mesmo sendo bem orientada ela vai colocar a prova os limites que foram recebidos e é ai que vai ser importante que os comportamentos da criança tenham conseqüências que elas possam sentir.

Punir vs Reforçar o comportamento.

A punição é a forma mais utilizada na educação infantil. Infelizmente é a menos eficaz para moldar o comportamento. Mesmo assim, vai ter sua utilidade quando utilizada de forma correta. Bater nos filhos é a forma mais comum e menos eficaz de punição. Primeiramente, quem bate nos filhos está mais preocupado em descarregar a raiva que teve com a criança do que em educar. Bater no filho mostra a insatisfação do pai, mas não mostra o comportamento desejado. Apanhar pode gerar medo de levar outra surra, mas não facilita que a criança pense realmente no que fez (sem falar que bater no filho hoje em dia é crime).

A forma mais eficaz de punição seria o castigo. O castigo seria a criança perder algo que valoriza por um determinado período de tempo como conseqüência de algo que fez e que sabia que era errado. É importante que a criança já tenha sido avisada e que tenha sido conversado que ela seria castigada caso se comportasse de determinada forma. Castigar uma criança que não sabia que não podia fazer algo só alimenta a idéia de injustiça e não vai atingir o resultado esperado. É importante que o castigo tenha uma duração estabelecida (um início e fim) para que fique a sensação de que se perdeu algo durante um tempo por causa de alguma atitude que foi considerada errada pelo adulto.

Porém, mesmo o castigo tendo sua utilidade, a maneira mais eficaz de se moldar um comportamento é pelo reforço. Ou seja, estimular o comportamento que se deseja e recompensar a criança quando apresentar tal comportamento. Existem dois tipos de reforço: o natural e o artificial. O natural é mais eficaz. Principalmente quando utilizado desde muito cedo. Trata-se de demonstrações de reconhecimento e afeto quando as atitudes tomadas são apresentadas. É muito mais eficaz demonstrar alegria e reconhecimento quando a criança está cumprindo uma obrigação do que punir ou repreender por que ela não está fazendo. No primeiro caso você estimula que no futuro ela busque o bem-estar causado pelo reconhecimento e carinho. No segundo caso você faz com que a situação se torne desagradável, não gerando a satisfação necessária para se tomar as atitudes desejadas. O reforço artificial é aquele em que recompensa o bom comportamento com algo material. Apesar de se estimular o comportamento desejado, neste caso o bom comportamento acaba funcionando como moeda de troca e quando a recompensa para o comportamento tende também a parar. Esse tipo de reforço pode ser útil em situações especificas, como ser recompensado por atingir uma meta. Mas não deve ser utilizado em situações mais rotineiras como ser educado, e respeitar os outros. De qualquer forma o reforço natural tende a estimular e desenvolver melhor e mais espontaneamente os bons comportamentos. Devendo, portanto, ser mais utilizado no processo de educação.

Participação dos pais nas atividades que se deseja reforçar

É importante a participação do adulto nas atividades que se deseja que a criança faça por conta própria no futuro. Se for desejado que futuramente a criança estude por conta própria é preciso que no início um adulto faça isso junto com a criança para com o passar do tempo ela possa fazer por conta própria. Primeiro porque o adulto vai servir como modelo e segundo por que participando da atividade o adulto pode monitorar que a tarefa vai ser executada de inicio ao fim. Depois que a criança estiver habituada com a atividade, ela deve ser estimulada a fazer por conta própria, ficando aberta a possibilidade de pedir ajuda caso tenha dificuldades. Desta forma você reforça não apenas a obediência, mas também a autonomia. Aqui vai ser importante a utilização do reforço natural para que a criança se sinta mais à vontade de realizar as atividades por conta própria.

Criando regras e colocando limites

A criação de regras é imprescindível para uma boa educação. A criança tem a tendência de testar os limites que são impostos. Se esses limites não estiverem claros. Ou ainda, se não existe autoridade vai haver problemas em relação à obediência. Se existe horário pra estudo, pra brincar e para dormir, isso deve ser deixado claro e é necessário, como foi dito anteriormente, a presença do adulto para que isso seja seguido com freqüência até que a regra seja estabelecida para criança. Não adianta o pai dizer que precisa tomar banho e esperar que a criança faça isso por conta própria senão tiver sido criado a regra de tomar banho a uma certa hora ou depois de certa atividade e não tiver acontecido no passado a participação ativa dos pais no processo.

Tom de voz, postura e obediência.

O Tom de voz e a postura que se fala com a criança vão ser fundamentais para que haja obediência e para que a autoridade seja implementada. Pais que falam muito baixo não passam segurança, pais que falam rindo não passam seriedade, pais que falam gritando estimulam a agressividade, pais que falam de longe não vão conseguir se colocar adequadamente. O mais adequado seria se falar com tom de voz médio, com firmeza e serenidade ao mesmo tempo, na frente na criança e com o contato visual. Esse tipo de interação estimula o respeito e autoridade e se usada com freqüência possibilita que no futuro apenas uma ordem simples seja obedecida sem maiores dificuldades.

Quando se consegue que alguém obedeça por vontade própria sem se sentir agredida ou ofendida se diz que existe autoridade. Quando se usa da força ou poder para se conseguir o que se quer dizemos que existe autoritarismo. Se os pais desejarem ter uma boa relação futura com os filhos é mais saudável que tenham autoridade, mas que não sejam autoritários. Isso possibilita uma relação de respeito, obediência e mesmo assim afetuosa.

Importância de a criança ter orientações coerentes e o problema de parentes interferindo na educação.

Muitas vezes um dos pais ou ambos educam de forma adequada os filho e mesmo assim surge o fenômeno da indisciplina. Isto acontece quando existe algum familiar orientando ou educando de forma incompatível com um dos pais ou quando os próprios pais são incoerentes na forma de educar. Pode ser que algum dos pais oriente a criança que algo deve ser de uma forma e outro diz que deve ser de outra. Que um coloque regras e outro tire, que um proíba e outro permita, que um diga “não” e outro diga “sim”. Isso pode acontecer tanto entre os pais ou entre pais e família (Avós e tios). Se a criança for educada com uma pessoa orientando de uma forma diferente da outra vai gerar uma confusão sobre o que é certo e o que é errado. Vai dificultar a idéia de limite. O limite vai se tornar a própria vontade da criança. É nesses casos que vemos crianças mais desobedientes ou que dão escândalo porque não conseguiram o que queriam e que acham que as coisas devem ser da maneira que elas querem, afinal se cada familiar orienta de formas diferentes acaba não existindo uma forma certa de agir para criança e sim apenas a forma que ela deseja.

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Criar uma criança vai muito além de se seguir uma receita predefinida sobre o que é certo e errado. Esse texto teve por objetivo orientar sobre atitudes que ajudam e que são importantes no processo da educação infantil, porém educar não se resume a isso. Educar, acima de tudo, é ter bom senso e equilíbrio. É preparar a criança para o mundo, é gerar proteção e autonomia ao mesmo. É permitir que a criança possa explorar o mundo, que desenvolva seus próprios interesses, estimulando sim, mas nunca impondo as próprias vontades e interesses. É aprender e se permitir a entrar em um mundo novo de possibilidades em que não existem certezas, apenas a confiança de que vale a pena dar o seu melhor.

É amar na medida certa.